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O esquecimento e a demência: as relações com o estresse e modo de vida.

O esquecimento e a demência: as relações com o estresse e modo de vida. Psicologia Junguiana

“A psique e o corpo funcionam juntos de maneira poderosa para curar a alma em sofrimento, ou resgatá-la de situações intoleráveis”.

Ashok Bedi, M.D

Quem numa conversa não se esqueceu de repente do que iria falar ou quando na busca de algo em outro ambiente em sua casa, se esquece do que iria buscar, ou ainda dando uma aula, tem uma questão que é importante e sente um branco. Correspondem a momentos que perdemos o contato temporariamente com o que estamos fazendo. Falhas temporárias, esquecimentos que passam despercebidos e muitas vezes não nos preocupamos, e deixamos passar.  As vezes pode ser um sinal, de que nosso sistema nervoso central, possa estar entrando em colapso, por um momento estressante de nossas vidas, problemas afetivos, grande exigência do meio social ou ainda alteração orgânica e funcional. Apesar de aparecer em qualquer idade, as vezes há preocupação de ser o indício de um estado demencial.

Frequentemente o envelhecimento está associado a dificuldades de memória e à lentidão de raciocínio. Observa-se que os idosos têm dificuldades em lembrar e compreender situações novas, quando apresentadas rapidamente, mas em contrapartida superam os jovens em raciocínios que exigem maior “sabedoria”. (Parente, Taussik, 2002).

O envelhecimento é inevitável e está ligado a diferentes fatores, como: econômicos, culturais, tecnológicos entre outros.

Segundo a Organização Mundial da Saúde (OMS) (WHO, p.25, 2015), o envelhecimento constitui um fenômeno de mudanças complexas, não são lineares e nem consistentes e, portanto, são fracamente associadas com a idade em anos. Isso quer dizer que os mecanismos do envelhecimento são incertos e influenciados pelo ambiente e o comportamento de cada indivíduo.

A demência não afeta somente o indivíduo, acaba afetando a vida de todos ao seu redor, a partir disso é considerada um problema de saúde pública, justamente pelo comprometimento do indivíduo e alteração na vida de seus familiares, sendo um fardo econômico para as famílias e nações. (OMS) (WHO, 2012).

A memória seria essa capacidade de registrar, manter e evocar as experiências e os fatos já ocorridos. (Dalgalarrondo, p. 137, 2008).

Essa possibilidade de nos reconheceremos no presente, de saber onde estamos, quem somos, o que fazemos, com quem nos relacionamos, isto é, ter uma história de vida, corresponde a todas as experiencias de vida vivida, faz parte da nossa memória. (Jung, p. 283, 2013). Segundo Jung sem a consciência não conseguiremos nos relacionar com o mundo. Nós vemos, ouvimos, apalpamos, e cheiramos o mundo, através dos órgãos dos sentidos e a partir daí temos consciência do que ocorre ao nosso redor. Essas percepções sensoriais, nos diz o que está fora de nós, mas não nos dizem o que isto seja em si. Esta tarefa faz parte da apercepção, que consiste em um complexo processo psíquico sensorial, onde há cooperação de diversos processos psíquicos.  (Jung, p.284, 2013)

A Neuropsicologia tem demonstrado que a crença de que o envelhecimento constitui um período de declínio inevitável está sendo atualmente desafiada, considerando o aumento de sujeitos que envelhecem não apenas de forma ativa e independente como também de forma criativa. (M Parente, I Taussik, 2002)

Segundo Dalgalarrondo (p. 137, 2008) há quatro tipos de memória: memória cognitiva – habilidade do indivíduo de registrar, conservar e evocar elementos obtidos através de experiências; memória genética, seria  a carga genética transmitida pelos seres vivos ao longo da evolução filogenética das espécies; memória imunológica, informações registradas e potencialmente recuperáveis pelo sistema imunológico de um ser vivo; memória coletiva ou cultural, corresponde aos costumes, valores e práticas culturais geradas e passadas para um grupo social. Há uma diferença em relação ao tempo, ou seja, a memória imediata ou de curto prazo (poucos segundos de 1 a 3), memória recentes (de poucos minutos até 3 ou 6 horas) e memória remota ou de longo prazo (meses ou anos).

O déficit cognitivo leve apresenta um conjunto de síndromes associadas, ou seja, queixa de falhas mnésicas (confirmadas por pessoas próximas) sem interferência nas atividades do dia a dia. Esses distúrbios não apresentam confusão mental, lesão cerebral orgânica, distúrbios psiquiátricos ou uso de drogas psiquiátricas., mas diferente da Demência, observa-se um comprometimento cognitivo geral que resulta em um declínio funcional. (Ritchie et al, 2017).

De acordo com a Alzheimer’s Disease International (p. 8, 2009) há uma projeção para 115 milhões em 2050. Esse aumento afetará os países em desenvolvimento, ou seja, 36 milhões de pessoas vivendo com demência em algum lugar do mundo.

Há diferentes síndromes demenciais devido as perdas de múltiplas habilidades cognitivas funcionais, sem falar nos aspectos clínicos, segundo Dalgolarrondo (p. 376, 2008): perda memória (principalmente recente), alterações da linguagem, da compreensão dos problemas, prejuízos na aprendizagem e julgamento, alteração das funções executivas relacionadas ao lobo frontal, como o prejuízo na capacidade de planejamento e monitorização de atos complexos, queda da fluência verba, perda da flexibilidade cognitiva, dificuldade pensamento abstrato, alteração da personalidade, com a perda de hábitos sociais mais refinados e do controle emocional, além do descuido com a higiene pessoal e alimentação, o progredir da síndrome é silencioso, progressivo e muitas vezes irreversível, mas existem algumas formas tratáveis e reversíveis de demência, a síndrome demencial acarreta alterações no tecido cerebral, de forma difusa, crônica e geralmente progressiva, geralmente o indivíduo está desperto, vigilante, mas as vezes pode ocorrer momentos de delírio,  podendo  ocorrer aparecimento de sintomas psicológicos associados, com ideias paranoicas, depressão, ansiedade, delírios, alucinações.

A patologia que não se manifesta claramente é a degeneração do sistema nervoso central e os subtipos de demência compreendem a D. Alzheimer, demência vascular, demência dos corpos de Lewy e demência frontotemporal. (Ritchie et al, 2017).

Além da degeneração há várias causas relacionadas a demência: medicamentos, alcoolismo, neoplasias, desnutrição, hipotireoidismo, hipocalcemia, traumatismos cranianos, infeções (HIV), inflamações, hemorragia cerebral e outras. (Gil, R; p. 231, 2014).

As primeiras queixas de pessoas com doença do espectro de Alzheimer são geralmente problemas cognitivos, como planejamento e julgamento, perdas de memória. Essas queixas podem levar ao diagnóstico de Comportamento Cognitivo Leve (Mild Cognitive Impairment ou MCI), se houver testes que revelem uma evidência objetiva de alteração no comportamento cognitivo. Esse diagnóstico é importante para diferenciar essa população de um grupo com comprometimento cognitivo subjetivo, p.ex. queixas de perda de memória, sem serem detectados em testes neuropsicológicos provavelmente sem alterações degenerativas. MCI consiste numa condição heterogênea com pouco valor prognóstico. Esse comprometimento pode ter quatro desfechos; progressão para D. Alzheimer; progressão para outra demência; manter MCI estabilizado; recuperação. (Ritchie et al, 2017).

Segundo Vetersen comenta que muitos das características do conceito de MCI estão presentes no DSM-5 (APA, p. 591, 2013).

Sob o nome de Transtornos Neurocognitivos Leves, isto quer dizer que existe a possibilidade de que esse estado seja consequência ou associação a transtornos mentais, p.ex. transtorno depressivo maior, esquizofrenia, isolamento social ou mesmo um declínio cognitivo negligenciado em decorrência de envelhecimento e baixo nível cultural.

A função da consciência é reconhecer e assumir o mundo exterior, através dos órgãos do sentido e traduzir criativamente o mundo exterior para a realidade visível. (Jung, p. 103, 2013).

O conhecimento sobre o indivíduo, necessita um olhar mais cuidadoso sobre seu mundo interno, sua alma e suas relações com o meio ambiente, social, cultural, suas crenças, medos e experiencias de vida, antes de rotular-se aquele que nos procura.

Várias pesquisas demonstram que o exercício físico em idosos promovem benefícios em relação a qualidade de vida e a autoestima. (Silvai, et al, p.65,2019).

A atividade física por si promove mudanças na percepção da pessoa sobre sua idade ocorrendo aumento da sua independência e integração social. Reduz o risco de muitas doenças crônicas em idosos, como as doenças coronarianas, a hipertensão, arterial sistêmica, o diabetes mellitus etc. Também melhora os aspectos emocionais. (Silvai, et al, p.65, 2019).

    Pensando no aspecto cognitivo o exercício físico, a curto prazo, melhora a função cognitiva porque aumenta o fluxo sanguíneo, a oxigenação e a nutrição cerebral; a longo prazo, observa-se aumento da performance cardiorrespiratória com consequente melhora prolongada da oxigenação cerebral, queda do LDL e liberação de fatores antioxidantes que ajudam a retardar a perda cognitiva da lesão cerebral.

As famílias e os indivíduos devem se preparar e se planejar para a velhice, mostrando força de vontade e esforço com adoção de uma postura adequada como a prática de atividades saudáveis em todas as fases da vida (alimentação saudável, atividade física etc.).

Ao falarmos sobre o estresse e as questões de esquecimento, estudos demonstram que a ansiedade é uma das causas de perda de memoria em todas as faixas etárias. A ansiedade faz com que ocorra ativação de inúmeras regiões do cérebro e aumento da atenção e hipervigilância a estímulos ameaçadores, como na tentativa de lembrarmos do nome de determinada pessoa, que se encontra na nossa frente por exemplo. (Parente, Taussik, 2002).

Segundo (Jung, pg 278. 2013), uma lembrança, um afeto, será consciente se tiver relação com o eu. As situações estressantes, como a ansiedade, podem em determinado momento, fazer com que o indivíduo se esqueça de quem é e o que está fazendo, qual a data atual, ou quem ele conhece e perceber sua situação, deixando-o mais nervoso e inseguro. Esses esquecimentos demonstram, como as situações estressantes, podem fazer com que muitas situações vividas se percam em algum lugar na sua psique, tornando-se obscuras e inacessíveis.

No envelhecimento temos que lidar com nosso mundo interior, com as questões do Self, com as camadas do inconsciente pessoal que ainda não foram assimiladas. O envelhecimento psicológico está associado ao esforço pessoal contínuo na busca do autoconhecimento e do sentido da vida. Um olhar mais profundo sobre as experiências  vividas , e aprender a esperar sem precisar conquistar, buscar o equilíbrio espiritual como se fosse um alimento para a alma.  (Jung, 2013).

Ivone Ferreira – Analista em Formação pelo IJEP

Didata Responsável: Maria Cristina Mariante Guarnieri

Referências:

– AMERICAN PSYCHIATRIC ASSOCIATION. APA. Diagnostic and Statistical Manual of Mental Disorders DSM-5. – EUA, 2013.

– DALGALARRONDO, P. Psicologia e Semiologia dos transtornos mentais (2ª. ed) – Brasil: Artmed, 2008.

– GIL, R. Neuropsicologia (4ª ed) – Brasil: Santos, 2014.

– Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística. IBGE. 

–  JUNG, C.GA natureza da psique; [Tradução de Mateus Ramalho Rocha]. – 10. ed. – Petrópolis: Vozes, 2013.

– PARENTE, M.A. de M.P., TAUSSIK, I. Neuropsicologia, distúrbios de memória e esquecimentos benignos. Revista Eletrônica de Jornalismo, 2002.

– SILVAI, L.A.dos S.; DIAS, A.K.; GONÇALVES, J.G.; PEREIRA, R.A.; COSTA, R.S.; SILVA, G.O. A IMPORTÂNCIA DA PRÁTICA DE EXERCÍCIOS FÍSICOS NA TERCEIRA IDADE. Revista Extensão. – Palmas-TO: v.3, n.1, 2019.

Ivone Ferreira – 21/12/2021

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