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Aniversário do nascimento de Carl Gustav Jung (26/07/1875 – 06/06/1961) o chamado do envelhecimento


Muito se aprende com os mestres, principalmente com os grandes mestres. Não se trata de idolatria, isto fazemos com os gurus, mas de uma riqueza de aprendizado que nos leva a uma condição de autoconhecimento inigualável, daí nosso profundo respeito.

Jung mostrou-me uma pessoa que jamais pensei ser. Ao estudar sua obra e refletir sobre ela na minha vida, principalmente agora no anoitecer que se avizinha, encontrei muita luz e muita sombra. Tão grandiosas como jamais sonhara. De santa a pecadora eu percorro todos os domínios do céu e do inferno. No envelhecimento o conhecimento do pensamento de Jung faz com que percebamos as profundas modificações em nosso psiquismo.

Percebo isso também em cada um que se senta em meu consultório, infelizmente a percepção de si-mesmos é sempre muito distorcida. Nosso trabalho não é levar o paciente a um estado de plenitude, mas, como dizia Jung: “Eis porque o objetivo mais nobre da psicoterapia não é colocar o paciente num estado impossível de felicidade, mas sim possibilitar que adquira firmeza e paciência filosóficas para suportar o sofrimento”.

Assim é, o sofrimento não é uma opção, mas o que fazemos desta vivência, sim, o é.  Nosso trabalho é resgatar as grandes questões filosófico existenciais que trazem sentido à vida, que impulsionam ou paralisam o Processo de Individuação. Jung nos ensina que: “Nós, os psicoterapeutas, deveríamos ser filósofos, ou médico-filósofos – não consigo deixar de pensar assim……..´religio in statu nascendi` porque tudo o que envolve a grande confusão que está nos primórdios da vida, não existe uma separação que evidencie uma diferença entre filosofia e religião.”

Costumo dizer o seguinte ditado: “Com Deus tudo, sem Deus nada.” O Self, como Imago Dei, como o Atman, é a centelha divina em nós. Jung assim define nosso centro e totalidade psíquicas. Portanto, esse ensinamento que é de Jung, mas também muito anterior a ele, nos mostra como a religião é importante em nossa vida, principalmente na grande virada da meia idade quando o ter cede (ou deveria ceder) lugar ao ser.  E o chamado do Self, para nosso processo de individuação, se apresenta com muito mais força, através de sonhos, sincronicidade, sintomas e etc.

Neste momento da vida Jung nos ensina a importância do religere:

“A suprema dominante é sempre de natureza filosófico-religiosa – o que é próprio do dinamismo mais espontâneo da vida é o mesmo que jorra de uma atitude filosófico-religiosa…é muito natural que os distúrbios dos processos afetivos dos pacientes despertem no terapeuta os fatores filosófico-religiosos correspondentes.

Busca-se aí o recurso da filosofia e religião, de fora, que é fornecido à consciência.”

A passagem da maturidade para a velhice é esse momento de reflexão existencial onde as banalidades e superficialidades do cotidiano nos causam enfado e desânimo, esse momento, de se voltar para dentro, muitas vezes é entendido como depressão, mas na verdade, essa tristeza acontece com quem não resgatou, ao longo das suas experiências, o seu Mito do Significado, no dizer de Jung, ou seu mais alto fim existencial, como fala a homeopatia.

Por que estou aqui? De onde vim? Para onde vou? A que se propõe toda minha existência? Qual a imagem de Deus que encontro dentro de mim?

Um dia as grandes questões precisarão ser pensadas, se não vieram antes, no envelhecimento surgirão com certeza. No final da vida Jung dizia que esperava sim que a vida tivesse sentido. Era a fala do velho sábio, assim como responde ao repórter da BBC que lhe perguntara se acreditava em Deus e Jung, reflexivo, responde: Eu sei.

Sêneca: “Deve-se aprender a viver por toda a vida e por mais que tu talvez te espantes, a vida toda é um aprender a morrer”. “Vive mal quem não sabe morrer bem”.

Na velhice não há mais tempo para o que não seja essencial. Assim, a reflexão sobre a morte e o morrer precisa acontecer. Diz Nietzsche:

 “Muitos morrem demasiado tarde e alguns, demasiado cedo. Ainda soa estranha a doutrina: ´Morre a tempo!´

         Morre a tempo: é o que ensina Zaratustra.

         Sem dúvida, quem nunca vive a tempo, como iria morrer a tempo? Antes não tivesse nascido! – É assim que aconselho os supérfluos.

         Mas também os supérfluos levam sua morte muito a sério e também a mais vazia das nozes quer ser quebrada.

         Todos dão importância à morte; no entanto, ainda a morte não é uma festa. Ainda os homens não aprenderam como se consagram as festas mais bonitas.

         Eu vos mostro a morte que aperfeiçoa, que se torna, para o vivo, um aguilhão e uma promessa.

         Da sua morte, morre o homem realizador de si mesmo; morre vitorioso, rodeado de gente esperançosa a fazer auspiciosas promessas.

         Seria mister aprender a morrer assim; e não deveria haver festa na qual um moribundo não consagrasse os juramentos dos vivos.”

Quem de nós morrerá a tempo? Quando o tempo passa tão rápido e o corpo da velha carrega a psique da menina, da jovem, da mulher?

Sim é preciso conhecer O Mito do Significado de nossas vidas, buscar a todo momento a realização da plenitude, da inteireza, de realizar o si-mesmo. Só morre a tempo o ego que se rende ao Self, quem como Árjuna se rende a Krishna, quem se rende a si-mesmo independente da sociedade e dos “bons costumes”. Para que ajustar-se a uma sociedade esquizofrênica e consumista quando o Self almeja voos fraternos?

Waldemar Magaldi sempre diz que quem não vive para servir, não serve para viver, pois é. A quem eu sirvo?

Jung termina Memórias, Sonhos e Reflexões muito menos ligado ao ego do que as árvores, plantas e animais. Sim, ele estava conectado ao Todo, não mais o eu ou o nós, mas tudo, todos, Todo. Ampliar-se, expandir-se, não acumular, não ter mãos que seguram coisas e impedem-nos de voar. É preciso tornarmo-nos alados como Zaratustra, tornarmo-nos novamente crianças e nos encantarmos com as árvores, as plantas e os animais. Morrer na terra para germinar flor.

Jung, obrigado, onde seu espírito estiver.

Jung: “Se atribuímos uma finalidade e um sentido à ascensão da vida, por que não atribuímos também ao seu declínio? Se o nascimento do homem é prenhe de significação, por que é que a sua morte também não o é?”

Dra E. Simone Magaldi

Analita Junguiana

Membro didáta e fundadora do IJEP

Simone Magaldi – 16/06/2019

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