Site icon Blog IJEP

O Indivíduo e a Massa: a ética como ponte de transformação

Imoral é desistir de si mesmo – (Clarice Lispector)

Sob a ótica junguiana a relação entre o indivíduo e a massa – o coletivo de humanos ainda indiferenciados – nem sempre é harmônica. Muito pelo contrário, o mais comum é os interesses, metas e objetivos de individuação incomodarem à massa que pode se caracterizar até mesmo como uma força de oposição ao processo de individuação. Carotenuto (1994) discute essa situação sob a ótica junguiana nos capítulos finais daquele seu texto e propõe caber ao indivíduo os passos necessários para sua diferenciação. De acordo com Jung, a atitude ética é essencial para um posicionamento adequado e responsável em face de si mesmo, da coletividade e da Vida, de modo tal que o viver leve à individuação. O presente texto confronta algumas colocações de Jung (1989, 1990) a situações caracterizadas por Carotenuto (1994), procurando elucidar aspectos do indivíduo, da massa e de como a ética pode se constituir em ponte de transformação da massa para a via da individuação.

De acordo com Carotenuto (1994, pg. 134 e seguintes), a situação de solidão humana, da incomunicabilidade em sentido pleno, de sua realidade interior, é percebida como sofrimento interior que não pode ser curado por presenças externas. Quando necessidades essenciais não encontram respostas no mundo externo, no momento oportuno, o mundo da imaginação, da fantasia criativa começa a desenvolver a consciência da interioridade. Desse universo interior emerge “a sensação de verdade e a sucessiva organização de um ponto de referência que nos permite compreender a vida externa segundo a estrutura psicológica” (idem, p. 136). O autor não nega a existência real das coisas, pontuando que do contrário, não haveria nada para traduzir e interpretar (idem, 218). Ressalta, no entanto, que é precisamente este contato com a solidão que permite evitar toda forma de doutrinação. Para Jung (1990, p. 69) “o julgamento dos outros não é por si só um parâmetro de valor, mas somente uma informação utilizável. O indivíduo não só é capaz como precisa estabelecer a sua própria medida de valor para então aplicá-la. A ética é em última instância uma questão individual”.

Para Carotenuto (1994, p. 137) tal possibilidade de visão dos fatos – referenciados no próprio observador – constitui uma alternativa a observá-los apenas em sua aparência superficial. Tal profundidade “é a ponte com que buscamos superar o vazio em que nos encontramos” (Carotenuto, 1994, p. 137). Considera que o outro, por mais bem disposto não tem a possibilidade de efetivamente nos acompanhar em nossas vivências interiores e que podemos obter autonomia psicológica mediante a perda de ilusões (idem, pp. 140-1). No entanto, um único gesto afetuoso de outrem pode revitalizar a pessoa, trazendo-lhe bem estar, energia e confiança, à revelia da pretensa “independência” almejada. A proposta do autor é que se busque “alcançar um tipo de liberdade que permite atingir no íntimo de si mesmo a força necessária para o próprio bem-estar psíquico e para estar disponível em face dos próprios semelhantes”. Ou seja, alcançarmos um estado em que as interações podem nos trazer felicidade, mas “o nosso estado de ânimo e a nossa força já não dependem disso” (idem, p. 142). Considera também Carotenuto, que o mesmo objetivo deve ser o do relacionamento analítico, o desenvolvimento da autonomia do paciente, no sentido acima resumido (idem, p. 143). Prossegue pontuando que para tal autonomia se faz necessária a experiência da solidão – e que em sociedades desenvolvidas não há interesse em tal autonomia; deste modo, são criadas ocasiões e instituições para evitar que as pessoas fiquem sozinhas. Carotenuto (1994, p. 144) vê na solidão a oportunidade de escuta do que falta à própria vida, “uma abertura para a conquista de novos horizontes, para alcançar aquela capacidade comunicativa que a situação precedente não podia nos oferecer”. Vê na “expressão artística” oportunidade de síntese de tal experiência. Enfatiza a importância da individualidade e que seu cultivo pode gerar frutos únicos. Enfatiza a importância da vivência interior, do “segredo” pessoal e do silêncio quanto a este. Em síntese, para Carotenuto (1994, p. 147), “o sentido da solidão é uma das características essenciais da condição humana” e “tem uma função propulsora para o alcance de novas conquistas.” No entanto, enfatiza a dificuldade de se lidar com a solidão destacando ser na infância tal experiência ainda mais dolorosa. Isto porque embora tenha capacidade de perceber a solidão, a criança não dispõe de instrumentos adequados para se defender. “A própria vida se apresenta sempre desdobrada em oposições polares, mas como crianças não somos capazes de tolerar as ambiguidades” (idem). Em face das alternâncias de frustração e gratificação, defrontamo-nos com a “cisão pragmática do bem e do mal”. O autor (p. 148) considera que “a maior parte das pessoas adota uma das duas alternativas, negando a outra e, portanto, esquivando-se do conflito”, e desse modo, mutilando também seu pensamento. No entanto, em face de dimensões contraditórias, faz-se necessário “estruturar internamente uma condição de equilíbrio, a fim de evitar sermos dilacerados” e isso requer enfrentar o medo. Assim, “o indivíduo se torna intérprete de uma dimensão muito profunda, que se contrapõe à superficialidade coletiva” (idem, p. 149). O autor ainda enfatiza que a verdade profunda é sempre contraditória e que onde não existe contraste também não existe amor. Mais adiante enfatiza a vivência da própria solidão como estímulo a “conhecer o significado do que estamos vivendo e das pessoas que estão em torno a nós” (idem, p. 150). Considera que a pessoa criativa compreendeu que tudo pode ser justo e errado ao mesmo tempo. Pontua ainda que a única possibilidade para o viver humano é obter o alimento e o sustento dentro de nossa própria interioridade. Com a solidão interior podemos rejeitar linhas diretrizes exteriores e tomar consciência de nossa liberdade interior (idem, p. 151).

Em face das pressões para a polarização, a própria massificação, Carotenuto (1994) propõe a auto-observação, o conhecimento da própria Sombra – esta sendo reconhecida por ele ao mesmo tempo como o ponto fraco e a parte mais interessante e a mais viva da personalidade (idem, 153). Quando atacados em nossa Sombra, propõe em face do meio externo a luta e a defesa objetiva – e acrescenta que do exterior é fácil captar o aspecto mais fraco e indefeso de uma pessoa. Na dimensão interior propõe o confronto e a reconciliação com a dimensão “negativa” – não dispensável e que nos torna vitais. E destaca: “aqueles que aceitam viver o próprio mal, como parte integrante da totalidade são incômodos para o coletivo, porque o aspecto obscuro vai sempre contra as chamadas ‘leis morais do tempo” (idem, p. 156).

Carotenuto (1994) considera ser a maldade sempre coletiva – igualmente reconhecida por todos em uma coletividade. No entanto, destaca a importância da pessoa reconhecer o valor da própria individualidade, não a sufocando com critérios e avaliações gerais. Enfatiza a necessidade de se “ter a audácia de viver conscientemente também a própria sombra” – o que nos permite uma existência mais rica e completa do que se apenas nos ocupássemos em nos enquadrar em regras coletivas – as quais “são estruturadas de modo tal que neutralizam a dimensão mais secreta, mais específica de um indivíduo” (idem, p. 157). Comenta ainda sobre o sentimento de culpa que pode emergir ao se constatar a própria capacidade de realização com a experiência daqueles que pararam no próprio caminho. Enfatiza que o desenvolvimento psicológico significa o distanciamento psicológico de estereótipos que de fato, não correspondem à realidade.

Ressalta ser este ponto de crucial dificuldade nas relações com os outros – se esses estão regulados e orientados por aspectos coletivos e superficiais. Resalta, entretanto, que a dimensão social tem influência relevante sobre cada um e que sempre devemos estar atentos à nossa própria “tagarelice” – repetição acrítica do coletivo – em vez de exercício de efetivo pensar. “(…) quantas vezes nos encontramos, mesmo involuntariamente, a expressar juízos que na realidade não nos pertencem, que não são fruto de uma reflexão pessoal” (idem, p. 160). Prossegue ponderando que esse murmurar deve ter motivações profundas, dada sua força e intensidade. Associa-o à tendência a projetar no outro uma avaliação negativa que não soubemos aceitar para nós mesmos (idem). Ou seja, é sempre mais cômodo desqualificar o outro (“demonizá-lo”) que acolher dentro de si mesmo aspectos problemáticos, controvertidos (p. 161).

Um ponto especialmente destacado pelo autor é que na relação com o mundo nos tornamos “opacos”, dado que nosso “brilho” autopercebido é ofuscado pelas falhas que emergem apontadas por outrem, com as quais este e muitas vezes nós mesmos, identificamos nossa totalidade – ainda que nossa vida efetiva seja muito maior que tal falha. É preciso elaborar essa dor para crescer psicologicamente. De acordo com Carotenuto (1994, p. 162), “as modalidades coletivas de pensamento e de comportamento parecem assumir em si mesmas a luz e a positividade” (e com isso projetar no diferente e divergente a negatividade); “a ‘mãe é aquele coletivo que pensa por todos aqueles que não suportam o peso da própria autonomia” – dado que a autonomia implica uma atitude de vida que se dirige para uma realidade fluida e em contínua mudança, sem pontos de referência estáveis. Em face de nosso sentimento de pequenez e de inutilidade diante do universo, procuramos pelo trabalho superá-la – conviver com essa inferioridade ao menos. No entanto, enfatiza Carotenuto (1994, p. 163), muitos pensam que o único modo de se sentirem grandes é tornar o outro pequeno pela humilhação – colocar em evidência algo de que a pessoa se envergonha. Na humilhação, entretanto, há “um sutil e desleal mecanismo psicológico com o qual se acusa e se destrói justamente o que existe em nós e que compartilhamos com nossa própria vítima” (idem, p. 164). Aquele que tem como hábito ou vício o ato de humilhar (…) só consegue ver aspectos pequenos e medíocres da vida de quem humilha. Ou seja, nisso mesmo evidencia a própria mediocridade. O humilhado por sua vez está sozinho diante de seu próprio negativo e não pode valer por si. Não há olhos para a própria luz. Mesmo no processo analítico, muitas vezes incorre-se no procedimento de evidenciar apenas os aspectos da Sombra do paciente, sem reconhecer os aspectos luminosos, igualmente integrantes da personalidade do paciente. Lamentavelmente, ocorre, então, do paciente identificar-se com a própria Sombra e projetar no analista a própria luz (idem, p. 165).

A humilhação atinge uma fragilidade que tanto pode ser social como psicológica. Em casos de dominação e opressão psicológica e/ou social, “a identificação com o agressor só pode ocorrer quando já se perdeu a própria identidade” (idem, p. 166), quando o agredido é posto na condição de não ser mais íntegro – ou seja, é cindido em sua humanidade. A destruição do humano pode nunca ser superada mesmo após finalizada a situação de humilhação – “o instrumento mais errado de poder: se alguém representa um perigo por causa de suas ideias ou de seu modo de ser, existem duas vias para pô-lo em condição de não prejudicar: eliminá-lo fisicamente ou humilhá-lo. Em ambos os casos o homem perde-se a si mesmo” (idem, p. 171).

Em contrapartida, “quem exprime a própria individualidade sem identificar-se com o negativo e aceitando a própria diversidade vive uma ‘existência itinerante” (idem, p. 174) – sendo a personalidade itinerante sempre dinâmica, em constante desenvolvimento e não se adaptando a modelos estáticos. Entretanto, “o que diferencia do pensamento coletivo, da massa – entendendo com este termo a adesão acrítica a alguma ideia – deve ser encarado como ‘negativo” (idem, p. 175). A única visão que permitiria o encontro de ideias seria, ao contrário, a fundamentada no pluralismo. Ainda assim, Carotenuto (1994) pontua o risco de se desenvolver um estilo de vida baseado apenas na oposição. Lembra ser obrigatório em fase da vida infantil contrapor-se às pressões externas afirmando um estilo pessoal. Tal fase deveria ser superada, harmonizando-se as próprias forças e assim tornando secundário o estímulo proveniente do que há de externo à própria vitalidade autônoma (idem, p. 176). Caso contrário, corre-se o risco de uma existência inútil e vazia, preenchida pelos “inimigos”, ao solicitarem de nós uma reação, fundamentando a personalidade em um ponto externo a nós mesmos (idem, p. 176-7). Importa integrar os aspectos nossos projetados nesses outros – ainda que esses de fato sejam portadores das características que neles percebemos. No desenvolvimento psíquico importa recuperar nossos aspectos rejeitados e nos confrontarmos com eles. “Pela aceitação da própria conflitividade a pessoa traz consigo o alimento necessário para expandir-se criativamente na própria existência” (idem, p. 178), em uma situação “neguentrópica” em que há no próprio indivíduo uma passagem contínua de energia entre dois polos opostos. “Embora possa parecer paradoxal, a exigência interior de reparar uma situação de desarmonia nos mantém em tensão contínua” (idem, p. 173). Destaca a profunda exigência psicológica de transmutar o que parece inferior em valor positivo (idem, p. 180), que devemos confrontar com a realidade externa o “mal” interior, a vontade predatória, violenta, agressiva, autoafirmativa. É aqui que nasce a decisão de viver e de não suportar passivamente a existência. (…) na realidade, ninguém é medíocre, decide-se simplesmente viver em semelhante condição. Entretanto, feita tal escolha pela mediocridade, da percepção da própria incapacidade de realização nasce o impulso para o domínio, que visa bloquear a criatividade do outro – “nenhum homem verdadeiramente criativo pode desejar afirmar a própria supremacia sobre os outros” (idem, p. 187). O indivíduo criativo aceita a relação com os outros porque vive com sua autonomia. Em contrapartida, há quem deseje a morte alheia por esta pretender ser testemunho de sua força (idem, p. 189).

Jung (1990, p. 46) destaca que “hoje espera-se que o Estado realize aquilo que o indivíduo não pode realizar. Esse pensamento constitui, porém, o início do plano inclinado que faz com que se desça para uma psicologia de massa em que, nos conceitos de organizações superpoderosas e de grandes números, o indivíduo desaparece como simples cifra.” Carotenuto (1994, p. 195) destaca que embora demagogos e ditadores enganem com a promessa de uma libertação da necessidade, “nós só nos sentimos livres no momento em que aceitamos a possibilidade de estar sempre insatisfeitos”, (…) “a verdadeira existência é a do indivíduo que cria e combate contra a atração do nada” (idem, p. 195) e “a dimensão humana é sempre inferior diante da onipotência do nosso desejo”(idem, p. 200).

Segundo Carotenunto (1994, p. 200), temos tanto medo de nossos fracassos e aborrecimentos porque “a nossa dimensão oculta, a Sombra, emerge apenas quando nos encontramos nas mais graves dificuldades”. No entanto, destaca a importância de dizermos “sim” à nossa própria experiência individual em sua globalidade, aceitar a própria dor. Enfatiza que “só nós mesmos temos a possibilidade de lutar pela vida, assumindo a plena responsabilidade de tudo o que encontramos no percurso”. A coragem de enfrentar obstáculos nasce de seu enfrentamento – eles estimulam a expressão da dimensão interior. As dificuldades devem ser consideradas como elementos estruturais da vida: “é aqui que podemos forjar o destino; nessas situações cruciais devemos nos perguntar o que fizemos e o que fazemos de nossas características irrepetíveis” (idem, p. 208). Para esse autor, é nos momentos de dúvidas que temos a percepção de existir: “quando aceitamos o risco da opção entre soluções contraditórias sentimos que a alma vive” (idem). Para ele, “devemos nos harmonizar com a realidade, e a solução consiste em compreender que viver significa, sobretudo, entreter relações positivas com o medo” (idem, 211-12). O autor pondera que não sabemos dar ao medo o significado correto porque o lemos como resposta a uma situação que vem contra nós do exterior (idem, p. 220). Mediante reflexão, em face de uma situação que percebemos como perigosa alcançamos novas compreensões – o perigo se tornou fonte de ensinamento. Importa compreender que “o temor é alimentado pelas nossas projeções”. Com a reflexão se reduz a autonomia do inconsciente e a ação nasce apenas depois de ter passado toda a situação pelo crivo do Eu consciente (idem, p.220).

Para Carotenuto (1994, p. 216), como humanos “temos a obrigação de sair da inconsciência e de realizar as potencialidades pessoais que são do nosso conhecimento” (idem, p. 216) e “quando temos a clara percepção da interioridade, é nosso dever recuperar e exprimir o que o medo nos impede de fazer emergir de nós mesmos” (idem, p. 217). Assumindo o próprio processo de individuação, o ser humano “readquire a própria unidade, para a qual convergem as potencialidades conscientes e inconscientes: então ele sabe o que fazer de sua existência, porque conhece o desígnio inscrito nele” (idem, p. 217)

Em contrapartida, a organização coletiva tenta nos privar de toda segurança interior, substituindo nossos modelos mentais pessoais, colocando-se como único ponto de referência. Trata-se de uma dimensão pela qual somos constrangidos a permanecer infantis e a não pensar autonomamente – “com isso nasce a necessidade da figura do chefe que desempenhe para nós as funções diretivas” (idem, 222). De acordo com Jung (1989, p. 9), “para que o indivíduo se transforme em função do Estado é preciso eliminar quaisquer outras dependências e condicionamentos a dados irracionais”.

Jung (1989, p. 13) ressalta que “o Estado ditatorial mina de tal forma as bases do indivíduo que, não reconhecendo seus direitos e sua força espiritual, rouba o próprio fundamento metafísico de sua existência. Não há mais lugar para a decisão ética do homem singular, apenas para a comoção cega de uma massa obnubilada, onde a mentira passa a constituir o princípio próprio das ações políticas”.

Para Carotenuto (1994, p. 233) “compete somente a nós tornarmo-nos senhores e participantes da nossa dimensão espiritual e, no momento em que nos apropriamos dela, a própria realidade se torna completamente diferente.” Tal posicionamento diante da realidade configura-se como uma questão ética. E desenvolver uma atitude ética diante da vida é para Jung, passo essencial para a individuação.

Ainda que para Jung, a maior parte das pessoas permaneça massificada, acomodada aos ditames da coletividade – o chamado da individuação se coloca a todos. Não ouvi-lo tem seu preço cobrado em perda de vitalidade, de saúde física, psíquica e existencial. Ouvi-lo tem seu risco, sério e grave risco: viver a vida de fato.

Encerro o texto com uma homenagem à autora do verso da epígrafe desse texto, Clarice Lispector:

Imoral é desistir de si mesmo

Uma luz muito doce se espalha sobre a Terra como um perfume.

A Lua dilui-se lentamente

E um sol-menino espreguiça os braços translúcidos…

Frescos murmúrios de águas puras que se abandonam aos declives.

Um par de asas dança na atmosfera rosada.

Silêncio, meus amigos.

O dia vai nascer

A minha intimidade?

Ela é a máquina de escrever.

Sinto um gosto bom na boca quando penso.

Até cortar os próprios defeitos pode ser perigoso.

Nunca se sabe qual é o defeito que sustenta nosso edifício inteiro.

Depois de certo tempo,

Cada um é responsável pela cara que tem

E ninguém é eu,

E ninguém é você.

Esta é a solidão.

É uma infâmia nascer para morrer,

Não se sabe quando nem onde

Minha força está na solidão.

Não tenho medo nem de chuvas tempestivas

Nem de grandes ventanias soltas,

Pois eu também sou o escuro da noite

Na arte, a inspiração tem um toque de magia,

Porque é uma coisa absoluta, inexplicável.

Não creio que venha de fora pra dentro, de forças sobrenaturais.

Suponho que emerge do mais profundo “eu” da pessoa,

Do inconsciente individual, coletivo e cósmico

Não é saudade…

Eu tenho agora minha infância mais do que quando ela decorria

Não me posso resumir,

Porque não se pode somar uma cadeira e duas maçãs.

E não me somo

O fato de ter nascido me estraga a saúde

O que é verdadeiramente imoral é ter desistido de si mesmo

Os fatos são sonoros.

O que importa são os silêncios por trás deles.

Que ninguém se engane,

Só se consegue a simplicidade através de muito trabalho.

Renda-se, como eu me rendi.

Mergulhe no que você não conhece como eu mergulhei.

Não se preocupe em entender,

Viver ultrapassa qualquer entendimento

Vocação é diferente de talento.

Pode-se ter vocação e não ter talento, isto é,

Pode-se ser chamado e não saber como ir.

 Clarice Lispector

===============

Bibliografia

CAROTENUTO, A.  Eros e Pathos – Amor e sofrimento. São Paulo: Paulus. 1994. 240p.

JUNG, C.G. Presente e Futuro. Petrópolis: Vozes, 1989, 56 p.

JUNG, C.G. Aspectos do drama contemporâneo. Petrópolis: Vozes, 1990, 96 p.

===============

Autora

Silvia Maria Guerra Molina – analista em formação pelo IJEP- silvia.maria@gmail.com; (19)99151-0909 (Piracicaba, SP)

================

A Emanuel, Laura e Marcos José, dedico. Ao nosso país.

Silvia Maria Guerra Molina – 17/07/2019

 Voltar

Exit mobile version