Resumo: Em 1909, Jung deixou seu cargo no Hospital Burghölzli, em Zurique, e inaugurou sua clínica privada em Küsnacht, onde atendia em sua residência na Avenida Seestrasse, às margens do Lago Zurique. Assim, Jung pôde dedicar-se à prática clínica, recebendo clientes de diversas partes do mundo, como Edith Rockefeller McCormick. McCormick financiou a compra do imóvel que se tornou sede do Clube Psicológico de Zurique, onde mulheres sem formação acadêmica podiam participar das discussões. O movimento, pioneiro em sua inclusão, foi essencial para a difusão da Psicologia Analítica, com apoio de figuras como Olga Fröbe-Kapteyn e a continuidade das conferências Eranos. Nomes como Aniela Jaffé e Toni Wolff destacam-se entre as pioneiras dessa primeira geração de analistas.
Em 1909, Jung desvinculou-se de seu cargo no Hospital Mental Burghölzli, em Zurique, Suíça, e inaugurou sua clínica particular em Küsnacht. As consultas eram realizadas em sua residência, construída às margens do Lago Zurique, na Avenida Seestrasse (Avenida do Mar), no número 228.
Devido ao casamento com Emma Rauschenbach, Jung desfrutava de estabilidade financeira. Ele não tinha que se preocupar com o pagamento de contas, pois recebia um generoso estipêndio anual da empresa da família de sua esposa, a IWC Schaffhausen (International Watch Company), administrada por seu cunhado.
Com essa segurança financeira, Jung pôde concentrar-se inteiramente no atendimento de seus clientes, que vinham não só de Zurique, mas também do exterior.
Na época, viajar era caro e demorado, e aqueles que podiam arcar com uma viagem internacional pertenciam a uma elite culta e, acima de tudo, abastada. Um dos primeiros a cruzar o Atlântico em direção aos Alpes foi Joseph Medill McCormick, herdeiro dos influentes proprietários do jornal americano Chicago Tribune.
Logo depois, chegaram Edith Rockefeller McCormick e seu marido, Harold. Edith, filha de John D. Rockefeller, cofundador da Standard Oil, era uma figura destacada na sociedade de Chicago, conhecida pelo apoio a diversas causas. No livro As Mulheres na Vida de Jung, a analista junguiana Maggy Anthony relata que o casal viveu em Zurique entre 1913 e 1923. Inicialmente analisanda de Jung, Edith tornou-se analista. Seu maior apoio a Jung veio com a compra do imóvel que, em 1916, se tornou o ponto central das reuniões do círculo e a sede do Clube Psicológico de Zurique.
A propriedade adquirida por Edith Rockefeller McCormick situava-se em uma das áreas mais privilegiadas de Zurique, refletindo os altos padrões estabelecidos por ela: a participação era restrita a um seleto grupo de pessoas. Contudo, com o tempo, o Clube Psicológico de Zurique mudou-se para uma sede mais modesta, na Gemeindestrasse 27 (significativamente, “rua da comunidade” em português). Nesse local, Emma Jung presidiu o clube até 1920, seguida por Toni Wolff, que ocupou o cargo de 1928 a 1945. Até hoje, o Clube continua a oferecer palestras e atividades em sua sede.
Fundado pouco após o rompimento de Jung com Freud, o Clube Psicológico de Zurique tornou-se um importante centro de difusão da Psicologia Analítica.
Suas palestras, inicialmente voltadas para um público seleto, passaram a ser oferecidas principalmente em inglês, o que ampliou seu alcance internacional. Esse formato de palestras em inglês, além das em alemão, permanece até os dias de hoje, consolidando o clube como uma referência na transmissão das ideias junguianas.
Além do apoio constante de Emma Jung, que mais tarde teve seu livro sobre o Graal publicado postumamente por Marie-Louise von Franz, o Clube Psicológico de Zurique foi o epicentro de um movimento com um viés marcadamente feminista para a época. O clube ofereceu um ambiente fértil para a participação de mulheres sem graduação formal, em um período em que poucas universidades e cursos aceitavam representantes do sexo feminino. Essa abertura permitiu que muitas desempenhassem papéis importantes no desenvolvimento da Psicologia Analítica.
Outra importante apoiadora de Jung foi Olga Fröbe-Kapteyn (1881-1962), que, a partir de 1933, começou a organizar as conferências Eranos em sua villa às margens do Lago Maggiore, perto de Ascona, Itália. Essas conferências ainda são realizadas anualmente e visam promover encontros interdisciplinares.
Na obra, Anthony documenta um número significativo de mulheres que se tornaram analistas.
Embora a lista não seja completa, ela destaca várias figuras proeminentes, entre elas estão Aniela Jaffé, Barbara Hannah, Jolande Jacobi, Marie-Louise von Franz, Mary Ester Harding e Ruth Amman, cujas obras foram traduzidas para o português. Outras analistas junguianas notáveis dessa geração, como Liliane Frey-Rohn, Linda Fierz David, não têm suas obras traduzidas ou disponíveis em português. Além disso, algumas, como Bertine Long, Eleanor Bertine, Hilde Kirsch, Kristine Mann, Lucile Elliott e Margareth Baker, não publicaram ou não têm mais livros em catálogo em idiomas como o inglês ou alemão.
Ainda é necessária uma investigação para identificar brasileiras que possam ter integrado a primeira geração de analistas junguianos. Entretanto, é amplamente reconhecido o significativo compartilhamento de casos entre a psiquiatra brasileira Nise da Silveira e Jung, o que a coloca, de alguma forma, na segunda geração de analistas. Nise da Silveira foi convidada por Jung para participar do II Congresso Internacional de Psiquiatria, realizado em Zurique em 1957.
A inclusão de mulheres no círculo de analistas de Jung foi um marco significativo na evolução da Psicologia Analítica.
Desde o início, Jung demonstrou uma visão inovadora ao acolher e valorizar a contribuição feminina em um campo tradicionalmente dominado por homens. Esse acolhimento foi crucial para o florescimento de uma primeira geração de analistas junguianas, cujas contribuições moldaram profundamente a disciplina. A inclusão e o suporte contínuos a essas pioneiras não apenas enriqueceram a Psicologia Analítica, mas também estabeleceram um padrão de abertura e respeito pela diversidade que continua a inspirar e influenciar a teoria e a prática até hoje.
Monica Martinez – Membro Analista em formação IJEP
Monica é psicóloga clínica com Especialização em Psicologia Junguiana pelo IJEP, Jornalista, Doutora em Ciências da Comunicação pela USP
Waldemar Magaldi – Membro Analista Didata IJEP
Referências:
ANTHONY, M. As mulheres na vida de Jung. Rio de Janeiro: Rosa dos Tempos, 1998.
BERTINE, E. Close relationships: family, friendship, marriage. Toronto, CA: Inner City Books, 1992.
CLAY, C. Labyrinths: Emma Jung, her marriage to Carl, and the early years of Psychoanalysis. London/New York: Harper Perennial, 2017.
JUNG, E.; FRANZ, M.-L. VONZ. A lenda do Graal: do ponto de vista psicológico. São Paulo: Cultrix, 1995.
SILVEIRA, N. DA. Jung: vida e obra. 21. ed. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 2007.
SILVEIRA, N. DA. Imagens do inconsciente. Petrópolis, RJ: Vozes, 2015.
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