Resumo: Os mitos sempre tiveram uma atenção especial para a Psicologia Analítica de C.G. Jung, este artigo apresenta a Deusa Hécate e seus vários aspectos para contribuir na simbolização da natureza feminina.
É necessário vivenciar o mito; é assim que ele existe em nós. Ao escutá-lo, começamos a dançar, e essa melodia nos envolve, mesmo que não possamos compreendê-la de imediato. (Campbell, 1990)
Sentido da vida? Não, a experiência da vida. É necessário compreender o mito em nós, em nossa vivência, para que a dança aconteça internamente. (Campbell,1990)
Todas as mitologias exigiam, durante toda a história da humanidade, um exercício psíquico de imaginação. A criação de suas histórias com personagens diversos é uma representatividade de processos psíquicos e culturais.
Ao se tratar de um mito, não é apropriado o interpretar de forma literal e lógica, toda a simbologia emergida com a narrativa de um mito requer um olhar poético e metafórico.
A simbologia inspirada pela força do mito mobiliza a energia psíquica no qual gera transformações, novas formas de ser e se comportar no mundo, proporcionando um significado à vida, uma ampliação da consciência. Uma forma de integrar consciente e inconsciente coletivo, com as imagens primordiais em nós, os arquétipos. Como não conseguimos conscientemente olhar essas imagens arquetípicas, a linguagem metafórica dos mitos nos serve como espelhos.
Para Jung, os mitos são fontes fundamentais na Psicologia Analítica, nos presenteando com o conhecimento do que é mais arcaico em nós.
O mito é uma narrativa com conteúdos arquetípicos e extremamente simbólicos e é importante destacar que os símbolos geram a transformação da energia psíquica. A força dos mitos são os símbolos que trazem a mobilização desta energia. Por esse motivo, a sua interpretação não pode ser como de uma história qualquer e é um aprendizado para começar a observar os símbolos em nossas próprias vidas.
As Deusas e suas formas, características e percurso nos apresentam preciosidades da natureza feminina, que podem ser notadas presente em muitas mulheres na contemporaneidade.
A Grande Deusa, nos revela, nos inspira para as imagens arquetípicas, mitos que elevam e destroem, poderes na própria mulher, e transcendem à época.
Tudo está marcado na alma, no inconsciente e retorna muitas vezes, de maneira autônoma. Embora o processo de evolução da consciência tente desmerecer e arrancar seu poder, ela reaparece na arte, na criatividade, em comportamentos culturais, na sensibilidade e principalmente nas transformações necessárias no espírito da época.
Tomando a narrativa mítica e seus símbolos, e voltando as atenções para a natureza feminina, podemos estudar a Deusa Hécate. Ao evocar sua sabedoria e intuição, integramos passado, presente e futuro, facilitando o contato direto da mulher com suas pulsões e desejos, bem como sua relação com o corpo e em suas relações.
Deusa das encruzilhadas na mitologia grega, Hécate visualizava três caminhos ao mesmo tempo e sabia onde iriam dar na vida das pessoas. Ela é a deusa da intuição.
Hécate é uma deusa parente de Ártemis, filha de Preses e Astória. É uma divindade misteriosa e age conforme os seus atributos. Zeus concedeu alguns privilégios a Hécate e aumentou suas funções.
A deusa Hécate tem origens mitológicas obscuras e sabe-se pouco de sua história. Ela é muito valorizada pelo poeta Hesíodo, na obra Teogonia exaltando os dons concedidos por Zeus a Hécate por ter lutado ao seu lado na guerra com os Gigantes. (Varela, 2015)
Hécate é citada no sequestro de Perséfone por Hades. A jovem donzela foi colher um botão de flor e a terra se abriu. Hades, o Senhor do Mundo Inferior, surge e a rapta, levando Perséfone ao submundo. Hécate ouviu os gritos da menina.
Deméter, a mãe, procurou pela donzela por todo o mundo, sem sucesso. Hécate se aproxima e revela a Deméter ter ouvido os gritos da menina e sugere que procure o deus Hélio para saber o que realmente aconteceu. As duas deusas, Deméter e Hécate, descobrem a verdade: Perséfone foi sequestrada por Hades com o consentimento de Zeus (Bolem, 2005).
Depois de muita peregrinação e fingindo-se ser uma velha, passa algum tempo cuidando de Demofonte, filho de Metaneira e do Rei Céleo, Deméter é descoberta como a deusa mãe e então volta a procura de sua filha e a terra continua seca sem produzir nada. Os deuses entram em acordo com ela e Perséfone é liberada mediante acordo com Hades, ficando um período com a mãe e outro com o marido.
Após seu retorno, Perséfone encontra sua mãe Deméter e Hécate, que lhe dão as boas-vindas. A partir de então, Hécate está sempre ao lado de Perséfone.
Na descida ao submundo, Perséfone retorna, mas não é a mesma; a inocência dos dias em que colhia flores já não existe mais. É como se uma nova consciência surgisse, dada sua relação com Hades ambos se tornam conscientes de sua condição de adultos.
Sofrimento e amor fazem parte da vida; a resiliência na dor e o retorno da escuridão trazem sabedoria e fazem de Hécate uma companheira interior das mulheres.
Em busca desta verdade, a mulher na meia-idade se encontra em uma encruzilhada, sendo necessário refletir e buscar a força de Hécate na forma de intuição. Mudanças terão que acontecer nesta nova fase da vida, uma pausa para decidir qual caminho seguir e um espaço para a intuição trazer a resposta da alma nesta encruzilhada.
Esses pedidos de mudança não estão necessariamente associados ao mundo externo; muitas vezes são movimentos da própria psique ao notar que algo não tem mais significado e sentido na vida, falta alma.
A deusa Hécate, como representação das parteiras que se abrem para o novo, simboliza o nascimento de novos aspectos da vida. Para que o novo possa surgir, é necessário desapegar do velho. Sua sabedoria nos ajuda a deixar ir, a soltar o que não serve mais, a morte de algo para o nascimento de uma nova forma de ser.
Essa deusa misteriosa se tornou o arquétipo da bruxa, com sua relação com o oculto, o anoitecer, as feitiçarias e magias. Essa característica pode remeter a uma época em que as mulheres que se envolviam com o oculto e os mistérios eram condenadas à morte na fogueira em praça pública.
No entardecer da vida, a mulher se encontra em uma encruzilhada, e a força da deusa Hécate se faz necessária para um mergulho em seus impulsos interiores. Nessa fase afloram indecisões e reflexões diante do desafio. Se ela conseguir permanecer nesse lugar até que sua intuição indique o caminho, “emerge renovada e reformada”, em todos os aspectos de sua vida.
Euflausina Goes dos Santos – Membro Analista em Formação IJEP
Dra. E. Simone Magaldi – Membro Didata IJEP
Referências:
BOLEN JS. As deusas e a mulher madura: arquétipos nas mulheres com mais
de 50, 1ª ed. São Paulo: TRIOM, 2005.
Campbell J, O poder do mito, São Paulo: Palas Atenas,1990
CAMPBELL, J. A extensão interior do espaço exterior. Rio de Janeiro: Campus, 199l.
JUNG CG. Arquétipos e inconsciente coletivo, 10ª ed. Petrópolis: Vozes; 2013
JUNG, Carl Gustav. A energia psíquica. Tradução de Pe. Dom Mateus Ramalho Rocha, OSB. Petrópolis: Vozes, 1999.
WOOLGER, Jennifer Barker. Roger J. WOOLGER. A deusa interior. Tradução de Carlos Afonso Mal Ferrari. São Paulo: Cultrix. 1994
VARELA, JV, Hécate: Um Estudo Inicial, Lisboa: Faculdade de Letras, 2015.
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