O primeiro item a ser considerado e aprofundado sobre este assunto é a existência do arquétipo materno, este é uma forma, um molde comum a todos os seres humanos. De uma forma mais clara, podemos dizer que o arquétipo não é uma imagem comum, mas sim um molde psíquico, onde as experiências coletivas são despejadas, tomam forma e posteriormente se manifestam na vida das pessoas, através das imagens arquetípicas. Neste contexto encontramos um dos arquétipos mais importantes: o da mãe, ou complexo materno, denominação usada para a manifestação do arquétipo na psique individual. Em toda obra sobre este assunto podemos perceber que a importância da mãe na vida de todos os seres humanos é indescritível, sendo esta responsável inclusive pela capacidade de um indivíduo se relacionar e ter intimidade. Nesse contexto surge o questionamento: e se esse conteúdo importante para a psique humana e para o desenvolvimento da consciência e individuação tomar a forma negativa, e se essa mãe assumir a parte sombria e indesejada deste arquétipo?
Temos ainda a questão: nessa época em que as mulheres já tão pressionadas para que tenham sempre o melhor que a vida possa oferecer, sejam e estejam sempre felizes e dispostas, em que desde cedo somos impulsionadas a ser bem sucedidas em todos os sentidos da vida, quando nos tornamos mães, como lidamos com o inesperado e sombrio da maternidade?
No mundo contemporâneo a mulher está cada vez mais inserida no mercado de trabalho e as configurações familiares mudaram muito, devemos aqui citar também que o papel materno, a maternagem, que é o cuidado materno e não a maternidade que é o fator biológico, não é mais exercido exclusivamente por uma figura feminina, e vale ressaltar que todos, homens e mulheres igualmente, acessam o arquétipo materno via complexo materno e podem igualmente vivenciar o lado numinoso e sombrio deste arquétipo. Nesse contexto de mudança do papel da mulher e das novas configurações familiares, conjuntamente o papel de mãe também foi afetado positiva e negativamente, muitas vezes dificultando ou impedindo que a mãe surja, tal qual a conhecemos, pois a persona das pessoas ganhou um espaço cada vez maior. Num mundo em que cada vez mais somos impulsionados a sermos o melhor em tudo, nesse papel de mãe não podia ser diferente. Vemos em todo o nosso entorno mães (homens e mulheres exercendo esse cuidado) que desconsiderando a completude da alma, deixam o lado sombrio relegado ao esquecimento, mas como tudo aquilo que existe na psique precisa ser visto e reconhecido, esta sombra acaba as aprisionando em doenças, sintomas e sofrimento psíquico.
Quando a maternidade sobrecarrega, aprisiona, quando o filho difere da curva de desenvolvimento desejado, quando esse papel cansa e oprime, as mães muitas vezes se sentem falhas, ruins e preferem ignorar ou não reconhecer que este lado sombrio existe e deve ser acolhido.
Ao rejeitar, negar, esconder esta sombra nos furtamos a vivenciar a vida plenamente com seu lado sagrado e profano, negamos nossa completude e principalmente a possibilidade enorme de caminhar no nosso processo de individuação. Essa mudança profunda, esse olhar para tudo aquilo que nos incomoda e por vezes machuca é de uma riqueza ímpar, mas ela não ocorre sem dificuldade ou obstáculos, mas é capaz de mudar o modo como homens e mulheres enxergam a maternagem.
Natalhe Costa. Membro analista em formação pelo IJEP.
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