A prática da psicossomática é muito antiga, Hipócrates, o pai da medicina, já afirmava em um dos seus mais famosos aforismos: “O que te fere é o que te cura”. E a Medicina Tradicional Chinesa há mais de cinco mil anos também assume estes princípios. Desta forma, não é a psicossomática um conhecimento novo e alternativo. Ao contrário, nossa atual medicina, que é reducionista, mecanicista e causal, que acabou fragmentando o ser humano, dessacralizando o seu corpo ao assumir uma atitude invasiva, materialista e desumanizada, muito mais ligada ao consumismo capitalista do que as verdadeiras razões e necessidades da existência humana. Em consequência disso é que surgiu o ensino da psicossomática, que serve para recuperar os conhecimentos de homem integral, que jamais poderiam ter sido perdidos, transdisciplinarmente unindo a medicina com a psicologia, a filosofia, as expressões artísticas e as religiões – corpo, alma, mente e espírito.
No ocidente, Freud começou a estudar distúrbios físicos provocados pela psique, as famosas histerias conversivas. Atualmente, vários autores foram além, chegando à conclusão da inseparabilidade do trinômio: biológico, psicológico e energético, afirmando que qualquer desequilíbrio em uma parte refletirá na totalidade do ser. Assim sendo, todas as doenças podem ser consideradas psicossomáticas, porque nós somos seres psicossomáticos inseridos no contexto cultural e social que também é psicossomático. Nessa premissa nasce a PNEI – psiconeuroendocrinoimunologia, demonstrando que todo afeto – consciente ou inconsciente, real ou imaginário – é capaz de gerar alguma emoção, consciente ou inconsciente, ativando o psiquismo que imediatamente irá mobilizar o sistema neurológico. Este, por sua vez, irá gerar mudança no ambiente bioquímico e hormonal correspondente da emoção eliciada pelo afeto. Essa mudança endocrinológica, por sua vez, modificará o sistema autoimune deixando o indivíduo mais ou menos suscetível a doenças oportunistas, como bactérias, vírus, fungos ou vermes ou produzir as doenças autoimunes, manifestadas na conceituação patológica de reumatismos, bronquite asmática, psoríase, vitiligo, câncer, entre outras.
Nos estudos da psicossomática arcaica ainda se faz a distinção de doenças psicossomáticas das doenças somatopsíquicas, na tentativa de buscar um “responsável” pelo sintoma. Mesmo assim, a maioria das afecções dermatologias, respiratórias, gastrintestinais, autoimunes como o câncer e o reumatismo, são consideradas doenças psicossomáticas pela velha escola psicanalítica. Com isso, o profissional de saúde que não reconhece a moderna psicossomática sofre da ilusão do saber e corre o risco de cometer abuso de poder, devido a seu ceticismo racionalista, cartesiano e reducionista. Além de estar fadado a uma crise de ordem espiritual e emocional que o levará, invariavelmente, a questionar sua prática, ficar deprimido ou, reativamente e defensivamente, completamente dogmático e obcecado pela sua crença e sua prática de que a química ou o bisturi podem eliminar qualquer sintoma.
Desta forma, entendemos que os sintomas são expressões simbólicas que violam e revelam, por meio de suas secreções dolorosas, os segredos emocionais que estavam secretos, na maioria das vezes ocultos no que chamamos de inconsciente pessoal. Por isso, qualquer sintoma físico, psíquico ou relacional, permitirá que o cliente , aquele que se declinou e caiu, reorganize sua vida, incluindo outras dimensões à sua existência, integrando na consciência egóica atitudes de respeito e realização dos aspectos: físicos, sexuais, emocionais, familiares, laborais, sociais, políticos e espirituais, como uma unidade contínua em busca da evolução, realização existencial e transcendência.
Para Jung, a existência humana é a possibilidade para que o absoluto se manifeste. Mas, para isso, é necessária a mudança da consciência e de seu paradigma, possibilitando ao ego a capacidade de reconhecer e interagir com o mundo inconsciente, que estava na sombra, abrigando uma infinidade de antinomias, que são os pares de opostos, e possibilidades que podem ser de caráter instintivo, arquetípico, bestial, divino ou transcendental. Porque a negação desta tensão angustiante é geradora de neuroses e uma infinita coleção de sintomas, físicos e psíquicos, que só podem ser curados por meio do autoconhecimento, que promove à autoconsciência, o autodescobrimento e a autotransformação rumo à autoiluminação, possibilitando o estado de equanimidade do ego frente à adversidade e multiplicidade da vida.
Waldemar Magaldi Filho, Psicólogo, analista junguiano, mestre e doutor em ciências da religião, professor e coordenador dos cursos de pós-graduação, lato-sensu, que titulam e formam especialistas em Psicologia Junguiana, Psicossomática, DAC e Arteterapia do IJEP – Instituto Junguiano de Ensino e Pesquisa – www.ijep.com.br
Autor do livro: “Dinheiro, saúde e sagrado” – Ed. Eleva Cultural.