A queda da taxa de natalidade no Japão, levando a inversão da pirâmide demográfica e a índices negativos de crescimento da população, tem sido motivo de preocupação para o governo japonês há algum tempo. Dada a longevidade do seu povo, o topo da pirâmide tem se alargado enquanto sua base tem se estreitado, o que implica em ter menos pessoas em idade produtiva gerando um déficit que ameaça a sustentabilidade da previdência do país. Outro efeito, mais direto, é o saldo negativo entre o número de mortes e nascimentos, atualmente o país decresce 200 mil habitantes por ano e segundo projeções de especialistas até 2060 essa perda chegará a 30% do tamanho atual, levando o total de 127 milhões a cair para 87 milhões de habitantes.
Essa situação pode ser explicada em parte porque os homens japoneses se sentem inseguros e desencorajados para casar e constituir família, pois perderam a certeza de estabilidade no emprego após uma crise financeira nos anos noventa e também porque as mulheres japonesas estão cada vez menos dispostas a trocar suas carreiras pela maternidade, pois é costume no país que elas deixem de trabalhar ao se tornarem mães, 70% das mulheres deixam de trabalhar após a primeira gravidez.
Outras estatísticas também indicam motivos que contribuem significativamente para o número baixo de nascimentos no país: a queda de 30% no número de casamentos nos últimos 30 anos e o baixo índice de filhos fora do casamento, apenas 2% comparado aos 58% da França, por exemplo. Apesar de não ser um fator diretamente ligado à taxa de natalidade, como o casamento é uma condição praticamente necessária para os japoneses se tornarem pais, entender porque eles têm se casado cada vez menos passa a ser essencial para reverter o encolhimento populacional do Japão.
Antigamente os casamentos eram arranjados, ou seja, os casais eram formados independentemente dos sentimentos dos envolvidos, levando-se em consideração principalmente a opinião e a conveniência das famílias, dificilmente os diretamente envolvidos podiam opinar. Esse costume se tornou antiquado e agora as pessoas têm que encontrar sua cara metade por conta própria, porém apenas abandonar um velho costume não foi suficiente para que eles conseguissem exercer a arte natural, instintiva, da conquista, eles têm dificuldade e se sentem muito inseguros em deixar de ser meros expectadores e passar para o papel de protagonistas dessa busca.
Para os japoneses demonstrar carinho ou interesse por alguém é considerado um comportamento bastante inapropriado, ou seja, eles se sentem muito envergonhados com situações banais aos nossos olhos como cumprimentar alguém trocando beijos, andar d e mãos dadas com o namorado ou a namorada, dirigir a palavra ou trocar telefones com uma pessoa desconhecida do sexo oposto.
As carências decorrentes dessas inibições se tornaram uma boa oportunidade para criação de negócios que chamam a atenção pela forma impessoal com que tratam de questões tão pessoais. No “Café do abraço”, onde um rapaz paga por alguns momentos de aconchego, como ser abraçado por uma moça vestida com uniforme de empregada, deitar a cabeça em seu colo ou receber massagem nos ombros por cima da roupa, sendo que nenhum contato mais íntimo é permitido. Moças que nunca dirigiram a palavra a um rapaz desconhecido e que querem ter aulas de sedução recorrem ao “Namorado de aluguel” para contratar um rapaz que faz as vezes de um namorado, levando-a para passear de mãos dadas, ato quase que ousado para ela, dividindo um sorvete no parque e outras situações de casal para que ela se sinta a vontade na presença de um homem e que também dá dicas de como agir quando quiser se aproximar de alguém por quem esteja interessada. Mulheres estressadas pela pressão do trabalho podem contratar um “Ikemeso danshii”, serviço que consiste em enviar homens considerados atraentes para o escritório das clientes, assistirem juntos vídeos tristes para que elas possam chorar e descarregar suas tensões através do choro com um ombro amigo e ter suas lágrimas enxugadas por esses rapazes, ponto alto do serviço.
A fantasia também é uma forma que os japoneses encontraram de lidar com sua inabilidade em se relacionar. Mulheres que querem viver o sonho de uma cerimônia de casamento, mas que ainda não tem um noivo, contratam os serviços de uma realizadora de eventos para que elas possam ter a experiência com tudo a que têm direito, um lindo vestido, maquiagem, buquê, limusine e um álbum de fotos torne eterno esse momento, apesar de se oferecer um ator para posar como noivo, essa opção não é bem aceita entre as noivas solitárias. As heroínas dos videogames e mangás são as mulheres dos sonhos.
“A projeção é um mecanismo inconsciente que usamos sempre que é ativado um traço ou característica da nossa personalidade que não está relacionado com a consciência. Como resultado da projeção inconsciente, observamos esse traço pessoal nas outras pessoas e reagimos a ele. Vemos nos outros algo que é parte de nós, mas que deixamos de ver em nós.”
Dulce Ayako kurauti, Membro Analista do IJEP,
Bibliografia
ZWEIG, C.; ABRAMS, J. Ao encontro da sombra. São Paulo: Cultrix, 2006.
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