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Janus e o início de um novo ciclo

Janeiro, e começa um novo ano, 365 dias pela frente repletos de possibilidades e a esperança de um futuro promissor e de realizar tudo o que não foi realizado no ano que passou.

Para alguns, tempo de comemoração, para outros, mera formalidade e uma chance de comercializar uma data. Mas então porque comemorar o réveillon? Existe uma importância em se comemorar essa mudança de ciclo?

Existe sim. Não podemos, nem devemos, nos esquecer de que os rituais são importantes e trazem sentido aos acontecimentos da vida. Os rituais nos aproximam do inconsciente coletivo já que é comum a um povo. E a comemoração do réveillon é um ritual que abre as portas para o novo ano e encerra o ano que passou. Todo início de ano podemos olhar para frente, para o futuro e traçar planos levando em conta, ainda fresco na nossa memória, o ano que passou. A comemoração do ano que se inicia carrega em si uma imagem arquetípica: o mês de Janeiro (do latim Januarius) foi acrescentado ao calendário por Numa Pompílio (715-672 a.C.) e é consagrado ao deus Janus da mitologia romana.

Janus é um dos deuses mais antigos do panteão romano, e apesar de ser considerado um deus primordial, sua origem não é muito clara. Em uma das versões diz-se que ele é filho de Apolo e Creusa e que ainda jovem seguiu com uma extensa frota saindo da Tessália e chegou à região do Lácio, na Itália. Casou-se com Camese e ergueu uma cidade no alto da colina, chamada Janícula. Diz-se que seu reinado foi de paz, e ficou conhecido como a era de ouro.

Janus acolhe Saturno quando este foi expulso da Grécia por Júpiter, e como recompensa dá a Janus o poder de conhecer o passado e o futuro. Teria também introduzido o uso da moeda, do cultivo do solo, entre outros feitos. 

Vários templos foram erguidos e dedicados a Janus, entre eles o templo de Argiletum, feito em madeira, o que atesta sua antiguidade. Argiletum é também o nome da estrada mais importante de Roma, onde se encontra o Fórum Romano. Existe outro templo dedicado a Janus em Roma com duas portas chamadas de portais de guerra. Diz-se que as portas do templo permaneciam sempre abertas em tempo de guerra para que seus combatentes encontrassem o caminho de volta, e em tempos de paz permaneciam fechadas para que a paz não deixasse a cidade.   

Numa outra versão diz-se que o imperador Domitianus teria mudado o culto, substituindo a estátua por um busto de quatro cabeças para vigiar os quatro fóruns: o Fórum da Paz, o Fórum Transitório, o Fórum de Júlio César e o Fórum Romano. Mas até hoje a imagem mais divulgada de Janus é a bifronte, com um rosto olhando para trás, para o passado, e outro olhando para frente, para o futuro.

Algumas vezes podemos ver uma imagem de corpo inteiro, não muito comum, onde segura uma chave na mão direita e uma espécie de cajado na mão esquerda.             

Teria recebido o título de deus somente após sua morte e é considerado o deus de todas as portas, o porteiro celestial representado por duas cabeças, simbolizando começos e términos, paz e guerra, o dualismo de todas as coisas. Protege o início e o fim de tudo. Por esta razão o mês de Janeiro foi atribuído a ele. Janus era invocado antes de qualquer oferenda e antes de qualquer rito, mesmo que este fosse para outro deus. Isso era de extrema importância para os romanos como podemos ler num trecho escrito por Ovídio no primeiro livro de sua obra Fastos:

“Por que, embora deva aplacar os outros deuses, Janus, devo trazer o               incenso e o vinho primeiro a você?

Para que você possa acessar através de mim, que guardo o limiar, aquilo que deseja junto aos deuses.

Por que são alegres as palavras ditas nas Calendas, e nós desejamos uns aos outros bênçãos?

Para que Eu incline à pessoa, com a mão direita, o princípio de Tudo que está presente neste ato.

A primeira palavra dirigida aos ouvidos é como o augúrio do primeiro pássaro visto pelo adivinho.

Mantenha o templo e os ouvidos abertos para Mim, nem diga quaisquer coisas em vão, pois as palavras têm poder.”

Janus não foi sincretizado com nenhum deus grego, mas há comparações com Zeus e Hermes. Zeus é considerado o arquétipo central ou Si-mesmo e como tal pode ser entendido como uma totalidade anímica. Em outra versão de Janus, diz que ele teria uma face masculina – Janus, e outra feminina – Jana, e que Janus controlava a vida que Jana criava e nutria, transformando em presente o passado e o futuro, que só existem para quem não crê na totalidade da vida. Nesta versão podemos ver a semelhança entre Janus e Zeus. Já sua semelhança com Hermes se dá através da capacidade de ambos de acessar todos os reinos. Hermes, visto como psicopompo, tem a capacidade de nos colocar de volta no caminho a seguir. Podemos ainda relacionar Janus a Exú da mitologia africana pois Exú é visto como mensageiro, senhor dos caminhos e liga os humanos aos orixás. Ele, assim como Janus tem o poder da renovação, de acabar com o velho para dar lugar ao novo.

Janus pode ser considerado um senhor do tempo contemplando o mundo a partir de todas as perspectivas, visualizando a totalidade onde não existe bem e mal, branco e negro, luz e trevas, dia e noite e nos mostra que essa dualidade só existe para os humanos, pois a divindade guarda todos os mistérios e tem em si mesma o conceito do Um, do Todo, da completude, do self.

                                 Hino a Janus

Quem é Aquele que se move primeiro e todas as coisas o acompanham?

Quem é Aquele que permanece no limiar e permite a entrada e saída dos viajantes?

Quem é Aquele que detêm o poder superior e com seu báculo de autoridade desfere sentenças?

Esse é Janus, o Princípio de Tudo, a abstração da matéria, o fertilizador da existência!

Poderia o pássaro voar sem que o Ar permanecesse no firmamento?

Poderia o sacerdote tocar a face de Júpiter sem Aquele que o intermediasse?

Quem dentre os Imortais é tão poderoso quanto Tu?

Ave Janus!

O Universo encontra sua própria destruição, mas não consegue destruí-lo,

Pois Você, oh, Janus, é o próprio princípio finalizador de tudo e sem você nada há de suceder.

Quanto mais busco os deuses, mais encontro Você.

Se quero deitar oferendas

Se desejo fazer libações

Se anseio por entender os augúrios da Natureza

Como poderia sem o toque suave de Janus?

Provedor da paz, Janus Pacificus, nada foge ao seu controle

E mesmo que a guerra se faça presente, Janus Belliger, sabemos que com Seu poder ela terá fim.

Deus Divom, Deus dos Deuses, derrame Seu poder com intensidade e mostre sua face protetora.

Muitos são Seus nomes e Suas qualidades

Conceda-nos o adentrar dos mistérios e me torne seu Rex Sacrorum

Consivius, traga a riqueza para minha vida assim como Ceres faz crescer o broto. Venha Duonus Cerus.

Geminus, Janitor, Matutinus, Popanon

O que é ao mesmo tempo duplo, porteiro, a luz da aurora e o que recebe as oferendas

Vós és Janus! Mostre suas quatro faces, Janus Quadrifrons

E retorne com a paz há muito esquecida, Janus Quirino.

Ave Janus! Ave Janus!

Keller Villela – Psicóloga, Especialista em Psicologia Junguiana e Psicossomática. Membro Analista em Formação pelo IJEP.

Contato: (11) 982254490 consultórios Vila Mariana e Guarulhos

Referências:

O Livro da Mitologia; BULFINCH, Thomas. São Paulo: Martin Claret, 2013.

Mitologia Simbólica; ALVARENGA, Maria Zélia de. São Paulo: Casa do Psicólogo, 2010.

As Melhores Histórias da Mitologia Africana; FRANCHINI, A.S., SEGANFREDO, Carmem. Porto Alegre – RS: Artes e Ofícios, 2008.

http://mitographos.blogspot.com.br/2010/04/jano.html

http://blogdodrake.blogspot.com.br/2011/04/jano-e-jana.html

http://mahoutatsuryu.blogspot.com.br/2014/10/janus-deus-da-transicao.html

http://www.livius.org/articles/religion/janus/  

http://gephisnop.weebly.com/uploads/2/3/9/6/23969914/a_mitologia_e_a_filosofia_grega_-__duas_criaes_culturais_originais_-_cesar_nunes.pdf

Keller Villela 

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